domingo, 5 de janeiro de 2014

Ex-vazio

Eu tinha quinze anos e acreditava que amizade (que hoje eu entendo apenas como "amor", aquele sentimento nobre que dedicamos à pessoas especiais) era tudo na vida. Tinha muitos amigos, muitos mesmo. Sempre fui do tipo sociável, tagarela e extrovertida. Todo mundo sabia detalhes da minha vida, se houvesse o mínimo de interesse. Mas claro, quando somos adolescentes, temos uma necessidade enorme de auto-afirmação, de provar para alguém (quem?) que somos incríveis. E então, temos "melhores amigos". Ou amigas. Ou bests. Ou Bff.

Eu tinha um. Minha mãe acreditava que violência era uma ferramenta pedagógica e esse era um dos poucos assuntos que eu não explorava com qualquer um. E eu contava pra ele. Inclusive, ele foi a primeira pessoa no mundo a me garantir que aquilo não era normal ou saudável e, aparentemente, queria me ajudar com isso. 


Estávamos no colegial. Éramos populares. Juntos, formávamos uma invencível dupla de truco. Éramos legais, engraçados, bonitos, entendíamos de música, andávamos com as pessoas certas. Tudo espontaneamente. Quase forjado. Mas éramos autênticos.

Aí um dia, não éramos mais. Não éramos mais amigos.
E eu, que acreditava que amizade era tudo, ia acreditar no quê?

Hoje eu tenho 21 anos. Estou formada. Namoro um cara sensacional. Sou militante por diversas causas sociais. Estou tentando fundar uma ONG. 
Quero dizer: por que eu não estaria bem?

Não estou.
Honestamente, não saberia dizer bem o porquê.

Passei por uns maus bocados. Abusos de todos os tipos, bullying, escolhas erradas, doença psiquiátrica e falta de apoio. Especialista nenhum sabe o que pode receber a culpa. 
Não culpo.

Mas hoje, entrei no Facebook dele. Por curiosidade mesmo. 
Lembrei do colegial.
Lembrei da suposta amizade.
Lembrei que ele me abandonou.

Abandonar. Aquilo que a gente não faz com os amigos.

Estou bem.
Quero dizer: por que eu não estaria bem?

Mas lembrei. 
Sabe a síndrome do outro caminho?

Como seria?

Engraçado.

Hoje ele poderia aparecer na minha porta, na minha vida. Me chamaria pra tomar uma cerveja. Talvez.
Talvez daríamos risadas das bobagens impulsivas da adolescência.

Mas não faria diferença.

A dor aconteceu. 
Veja bem, eu - surpreendentemente - não guardo rancor.
Espero que ele esteja ótimo.
Não faço questão alguma de convite algum.
Não faria diferença.

Superei. 
Me formei, luto por coisas que acredito, vivo minha vida.
Mas não fiz mais amigos.
Tentei.
Desesperadamente.
Mas não flui.

Será que você sabe?
Como se sentiria se soubesse que uma atitude, talvez até insignificante, há muitos anos atrás, mudou completamente a maneira de alguém se relacionar com outras pessoas?
Acataria alguma culpa? Tentaria consertar? Seria possível?

Mas não faria diferença. 

(Faria?)



"Todas essas coisas que não eram para acontecer,
aconteceram.
O que acontecerá depois depende de você."


Ps: Se você quer brisar nesse assunto, recomendo ler O Último Dia da Sua Vida, do blog Thebrocode.