domingo, 30 de outubro de 2011

TO WRITE LOVE ON HER ARMS

Não chorou, não fez cena, apenas digitava no celular sua senha e instruções do que deveriam fazer com as coisas que lhe eram importantes.
Não cortou os pulsos, não foi encontrada no chão do banheiro, não pulou do alto do prédio.

Apenas chegou em casa, mais uma vez. Estava sozinha, mais uma vez. Como sempre. Injustiçada, como sempre.

"Já que todos estão contra você, não acha que deveria aceitar que está errada?"

Concordo. Estou, e olha, não foi por falta de tentativa de melhorar. Sempre quis ser boa, ser pura, ser exemplar. E sempre decepcionei a todos.

Cansei. Definitivamente. De uma vez por todas.

A cada comprimido vinha uma lembrança, que só me fazia ter certeza que aquilo era, sim, a melhor atitude. Comi um ultimo pedaço de pizza. Fui deitar.

Vomitei. Muito e muito forte. Minha mãe acabou ouvindo e trouxe um balde. Péssima idéia. Não saberia dizer em que momento, no meio da minha náusea, minha mãe encontrou as cartelas de comprimidos vazias. Três caixas e meia. Ela falava comigo, variando entre raiva, decepção e mágoa misturados no desespero. Quando eu conseguia, falava que já ia passar. Era a esperança. Dessa vez, ia.

Serviço público como SAMU não faz questão nenhuma de correr quando sabe que foi tentativa de suicídio. Acho que eles estão certos. Queria que minha mãe entendesse e me deixasse e largasse o telefone. Fiquei pior e usei toda e qualquer fora que me restava para chegar pro banheiro. A visão estava embaçada e a respiração falhava. O policial chega, arruma minha roupa, pergunta se eu briguei com o namorado e me coloca no carro. É incrível como as pessoas não entendem.

Não foi namorado, não foi uma nota baixa, não foi a grana curta. Foi a vontade de continuar respirando que desapareceu. Foi-se, apenas. Foram dezoito anos tentando agradar a todos, de verdade. Foram dezoito anos de nenhum sucesso. De feitos desprezados. Sentimentos esnobados. Ideias ignoradas. Pelo mundo. E só.

Nada mais importava. Nada de bebidas, de cigarro, de remédios. Só queria que parasse. Foi fácil tomar cada comprimido e, lamento informar que não me arrependo. Cada comprimido era tomado junto com um pensamento ou sentimento que não foi tão facilmente engolido.

Foi uma madrugada terrível de sondas, dor e julgamentos. Não havia uma pessoa sequer em todo o hospital que não estivesse disposta a me dar sermão e me ensinar a viver. Não tenho raiva. Tenho pena. Sério mesmo que eles acham que entendem? "Se conseguiu passar os comprimidos, consegue passar a sonda, mocinha". "Não, não pode beber água. Pode repensar sua atitude..." e o meu favorito: "Você tem de tudo, por que fez isso?". Vamos falar de valores e ideais, então, moça? Pode ficar com cada centavo que eu mesma conquistei sozinha se você convencer minha mãe a parar de tratar isso como se fosse pouco. Nunca mais reclamo dos meus tendões inflamados se você convencer minha irmã a parar de mentir sobre mim. E realmente, entrego essa vida que vocês estão insistindo em manter ao trabalho voluntário se você me apresentar um ser humano digno de admiração pelo bom coração. Aliás, faço qualquer coisa para ignorar a minha vida. Foi exatamente o que eu estava tentando fazer.

Não, não vejo nada de poético no suicídio. Enxergo apenas o desespero. Não foi impulso, não foi a primeira vez. E vejo a força de fazer pelo menos a minha última vontade ser respeitada: QUE PARE.

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