Existe uma diferença substancial entre se apaixonar e entregar o coração para outra pessoa.
Não sei vocês, mas comigo pelo menos, isso é evidente.
Você pode se apaixonar facilmente. Não significa que você quer comprar aquela paixão. É tipo compras mesmo: às vezes o sapato é lindo, te serviu, está dentro do que você pode pagar mas... você só não quer ver se ele vai durar ou te machucar um dia.
Sim, minha analogia preferida: homens e sapatos.
Voltando ao exemplo fútil, não quer dizer que não me apaixonei pelo sapato. Só tenho medo de sair no prejuízo.
Claro que as vezes estamos muito tristes e só precisamos comprar um sapato para manter a respiração. Mas é carência. É outra coisa.
O sapato ideal talvez não exista. Ao menos não para todo mundo. Não dá pra ser lindo, fiel, com sonhos razoáveis e que te diga "eu te amo" sincero todo dia de manhã. Dá? Eu tenho sapatos que eu defenderia com a vida, na tonalidade certa, confortáveis, valeram o investimento... mas tem um defeitinho, sabe? Acredito que seja natural.
O que estou tentando dizer é que eu posso me apaixonar. Já fiz isso várias vezes. Normalmente, escolho a forma que eu pareço idiota. Mas até gosto, sabe? Aquela ansiedade quando o telefone toca, o sorriso que escapa na hora errada ao encarar a tela do computador... Até quem é casado - e muito bem casado, obrigado - deve sentir falta dessas paixões. Essa que a gente tá arriscando ainda. Quando a gente não consegue nem esboçar uma previsão se vai acabar em bodas com os netos ou em terapia semanal. Medinho com borboletas no estômago é legal, sim, nem venha falar que não.
A gente é que não sabe aproveitar na hora. (Fica tranquilo, ninguém sabe lidar, muito menos eu.)
Se apaixonar é legal. Mas não quer dizer que você queira cair no choro toda vez que ouvir o nome da pessoa no futuro. Emily de A Lot Like Love foi taxativa: se você não está disposto a parecer um idiota, não merece se apaixonar.
E é verdade.
Não é?
Ás vezes a gente só não quer parecer idiota. Se vai perder o amor da sua vida tomando essa decisão, que seja. Tudo bem não estar pronto para a parte ruim do amor.
Tem muita gente que diz que quando dói, não pode ser amor. Dizem que o que dói é solidão, rejeição, indiferença, não amor. Não é bem verdade. Amor é combo. É um sentimento tão incrível e intenso que tem que estar disposto a tudo.
E quando a gente pega o jeito da coisa - essa que a gente chama carinhosamente de vida -, até pode ser que gostemos de uma pessoa. Rola um frio na barriga e você ri de coisas que nem tem tanta graça assim. Mas você só não vai poder lidar com o sofrimento do fim, caso ele venha. Não é covardia, é auto-proteção.
E eu entreguei meu coração. Duas vezes, em 21 anos. Me apaixonei umas dez.
As paixões foram legais. Tá. Sofri tal qual uma desgraçada quando acabou, mas todo mundo sabe dessa minha predisposição ao drama.
Mas foi bacana. Sentia toda aquela empolgação, desenhava corações em cada canto que sobrasse perto de mim quando eu dispunha de uma caneta, ouvia música brega e me identificava... As vezes o carinha me enrolava, outras eu até achava aqueles olhos verdes incríveis mas queria aproveitar o feriado na praia, outras ele fazia algum comentário bobo sobre futebol e eu decidia que não dava mais. Tudo isso só acontece quando a gente não entrega nosso coração. É a paixão amadora. Se não der certo, você liga para uns amigos e em 3 doses de tequila não sofre mais. Fica chateada, porque, quem nunca?, mas está ciente que sua vida não acabou.
Ao entregar o coração, é diferente. Você até está ciente que a pessoa pode não cuidar, mas você basicamente entrega o órgão na mão dela (o coração, ô mente poluída!) e fala: tó, faz o que quiser.
Você espera que ela cuide, mas ela pode muito bem jogar na lixeira mais próxima, quando como recebemos flyer de Trago Seu Amor De Volta Em Sete Dias (sério, não leia esse flyer, você é bonita, dá conta sozinha!). Pode nem jogar na lixeira, pode jogar direto no chão. E você além de magoada, vai ficar brava com a falta de civilidade e higiene do amado. E vai pagar mico, vai ligar pra amigo pedindo companhia para beber tequila, mas ainda vai chegar em casa triste e vai procurar no bolso o flyer para ao menos ir pedir uns conselhos pro pai de santo simpático.
Com o coração em mãos que não são as suas, você tenta enxergar diretamente por ele. Vislumbra todo um futuro que conta com uma casa de cerca branca, dois cachorros e um jardim. Possivelmente você nunca irá morar numa casa de cerca branca mas descobre que quer ou poderia querer coisas que não havia cogitado antes. Você para de querer a casa porque deve ser um inferno para limpar a tal cerca, mas dá entrada num apartamento. Você cresce. Entende porque nunca tinha entregado o coração antes.
Talvez a diferença se trate apenas do nível de envolvimento. Para mim, se trata de fé e confiança.
Eu não aposto em nada que envolva dinheiro ou meu sorriso. Me julguem. Entregar um coração envolve dinheiro (aguardando estorno de cada centavo gasto, por gentileza) e meu sorriso (existe algum tutorial que vocês mostram para bebês? Preciso lembrar como fazer).
Teoria da Cinderela, né? A gente acha que perdeu uma coisa importante demais para deixar pra lá.
E voltamos aos sapatos.
(Maiara tem 21 anos, está com dor de cotovelo e só é adepta da teoria da branca de neve)
Ps: Sei que tem gente que consegue entregar o coração por aí como se fosse bala. Não tem problema. Mas esse texto apenas não é sobre vocês e essa fé na vida que eu morro de inveja.
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