O autor da suposta piada disse que era frescura. Esboçou um argumento frágil sobre liberdade de expressão. Questionou meu senso de humor e indagou sobre minha postura de opinar no riso alheio.
Essa foi a cena, se você estivesse vendo de fora.
Por dentro, lembrei de quando roubaram minha pureza. Recordei, ainda que com limitações, de quando alguém colocou o corpo sobre o meu e me invadiu. Invadiu meu corpo. Invadiu minha alma. Me quebrou.
Cada dia da minha vida eu tento ignorar essas lembranças e agir como se algo tão devastador não tivesse me ocorrido. Ignoro minha própria dor, do melhor jeito que consigo. Normalmente, só comento sobre essa trágica experiência como forma de protesto e apenas com pessoas que sei que entenderão.
Cada dia da minha vida eu tento ignorar essas lembranças e agir como se algo tão devastador não tivesse me ocorrido. Ignoro minha própria dor, do melhor jeito que consigo. Normalmente, só comento sobre essa trágica experiência como forma de protesto e apenas com pessoas que sei que entenderão.
Mas hoje decidi escrever. Finalmente abordar o tema de forma pessoal.
Hoje não quero mais me calar.
Poderia escrever esse texto focando no chamado politicamente correto e repetindo o que todos já sabem: não há sequer sentido - quem dirá graça - em fazer humor com quem já sofre. Não deveria interessar à ninguém oprimir ainda mais quem já é oprimido rotineiramente. Isso é chutar cachorro morto. Suponho também, em opinião pessoal, que essa atitude parta de quem não tem lá muito caráter. Mas isso é apenas o que eu mesma vi da vida. Se você, anônimo, considera engraçado transformar um dos momentos mais aterrorizantes de alguém em uma piada, acredito que devo respeitar sua conduta. Quem sou eu para dizer o que tem ou não graça? É que quando me estupraram, eu perdi a graça. Deixei de ver graça na vida mesmo, vai ver. Quando fazem um comentário tão supostamente engraçado sobre violência sexual, talvez eu não acompanhe o riso porque eu lembro da força que fiz para me desvencilhar. É uma possibilidade que eu não aceite esse tipo de "piada" porque eu demorei anos para aceitar que levaram um pedaço meu quando fui vítima. Talvez eu não ria porque enquanto me estupravam, eu estava chorando.
Ontem foi o dia internacional da mulher, que muitos julgam desimportante. Eu não tenho nada contra receber flores, porque acho que cada mulher nesse mundo realmente merece qualquer tipo de felicitação, em contraponto ao tudo que passam e suportam a cada dia. Espero apenas que ninguém acredite que uma amostra da flora do planeta compense sequer um segundo de um dia qualquer na pele feminina.
Ontem foi o dia internacional da mulher, que muitos julgam desimportante. Eu não tenho nada contra receber flores, porque acho que cada mulher nesse mundo realmente merece qualquer tipo de felicitação, em contraponto ao tudo que passam e suportam a cada dia. Espero apenas que ninguém acredite que uma amostra da flora do planeta compense sequer um segundo de um dia qualquer na pele feminina.
Ontem eu não recebi flor, mas fui informada que não deveria me doer se alguém achasse engraçado a violência que eu sofri. Violência que tantas MILHARES de mulheres sofrem, sofreram ou sofrerão.
Ontem eu percebi na prática que cada um até deve ter o direito de rir do que quiser. Apenas não deve esperar que eu ria contigo.
Ontem é passado. O futuro mais justo e mais seguro eu estou construindo.
Após as violências que eu sofri, fiquei resistente. Forte. Sorrisos voltaram a comparecer na minha face.
Entre tantos ditados populares machistas, aposto agora todas as minhas fichas em:
Quem ri por último, ri melhor.
Quem ri por último, ri melhor.